"Eu quero um pacto com a simplicidade. Limpar os desejos ocultos. Eu quero ser analfabeta das miudezas, dos disse-que-disse. Meus bolsos, meus bolsos se desfazem das pedras de uma vida inteira carregadas pro vôo das jóias."

Maísa Picasso

8.8.06

Infância.

A casa do menino é de telha.
Que se esquece uma nas outras,vermelho-barro.
O menino, ora por vez, gosta de ver a vista lá de cima
que dá profundeza nas coisas, uma desacostumança do que é grande.

De cima do telhado do menino dá pra ver a casa inteira
e o quintal e as nuvens e as pessoas.
E tudo parece pequeno daqui de cima.
Tudo caixinha de fósforo.

De longe, se vê uma árvore,
de galhos longos que crescem pro alto
e folhas verdes largas que só nascem nas pontas, espetadas.

Do alto da telha, o menino vê ponto distante
de um preto azedume, azul - lilás.
Que de perto vira pássaro,
Pedinte que faz sesta nos galhos.

Do telhado, no alto,
O vento assobia canção de tempo
que chega num crescendo pra memória do menino.
Canção feito lamento de bicho:

-Me ajude a ser livre, diz pro menino.
E eu, que faço?

Do alto do telhado, sentado nas telhas,
esquecidas umas sobre as outras,
o menino vê a casa e o quintal, as nuvens e as pessoas.
Vê pássaro feito ponto preto,azul-lilás
e árvore alta com galhos que destemem o infinito.

E de lá do alto que se vê as coisas miúdas antes grandes,
de lá das desacostumanças,
o menino torna raza a vida:

- Se livra, se livra.

É da vista excedida de quem se acostuma a olhar do alto,
vista noturna, precisa,
que da árvore à vida o pássaro.
só era preciso, só era preciso soltar os galhos.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bom dia, Mai. Coisa boa ter aportado aqui e encontrado tão bela poesia. Quem há de duvidar da beleza pura da meninez da vida?
"gosta de ver a vista lá de cima
que dá profundeza nas coisas, uma desacostumança do que é grande..." Belo! Muito, muito bonito!

Anônimo disse...

Mai, cheguei aqui através do blog da Sarah. Fui deixar um carinho para a semana que inicia e encontrei seu comentário. Vc começava falando que gosta muito da Billie e finalizou com "desses nossos jeitos de não se revisitar, da escuta, de sermos mestres em pedirmos "me liberte", enquanto somos nós que não soltamos as coisas dificultando o vôo..." Bem, li isto e vim diretinho para cá. rs...
Legal saber que vc mora em Salvador. Deu pra notar que também moro na Bahia? rs... Eita, que eu amo esta terra! rs...
Bju n'ocê